terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Almofadas Holandesas

- Vamos comprar almofadas, ela disse.
A máquina de lavar roupas rugia como um animal enjaulado na minúscula área de serviço, do banheiro vinha um cheiro de produto de limpeza. A luz ficou acessa. Pensei no dinheiro que gastávamos todos os meses em contas que jamais diminuíam, pelo contrário, engordavam como porcos.
- Almofadas holandesas; tem uma loja aqui perto.
E com olhos apontou a direção para além da janela. Concordei sem dizer palavra e também não levantei do sofá para ir até o banheiro apagar a luz. O céu estava nublado, choveria como no dia anterior. Alguém teria de sair para comprar comida. Como não sou eu que cozinho, não vou, ruminei, olhando de soslaio, depois tentando me concentrar no livro que tinha nas mãos. Um livro de contos de um autor espanhol. Desde o dia em que um amigo me confessara que ler mais de um conto o deixava cansado, o mesmo passou a ocorrer comigo. Leio e quando vou iniciar o próximo, sinto uma espécie de desânimo similar a chegada do sono, então lembro o que ele falou e abandono o livro em qualquer lugar. No dia anterior, no período mais intenso da chuva, eu estava na rua com um DVD debaixo do braço, uma sacola de pão e uma sombrinha com as varetas quebradas. Molhei os tênis e as calças até os joelhos. Ela me perguntou por que eu não peguei um táxi. Não vou, estava decidido.
- Estão em promoção, parece que R$40,00 cada uma.
Achei um abuso, uma extorsão. Olhei-a com espanto e desdém.
- Caro? Ah! Mas devem ser bonitas.
Levantou-se da cadeira. Quem ali sentava permanecia de costas para a luz do sol e para a nesga de árvores que havia restado no bairro tomado de concreto embrutecido, como se estivesse a negar o que vinha de fora ou aquilo que, talvez, estivesse se exaurindo sob nosso olhar distraído. Mas eu também não queria nem saber o que tinha lá. Voltei novamente os olhos para o livro.
- Vamos no super?
Levantei a cabeça e ela surgiu toda arrumada, pronta para sair. Não pude conter:
- Qual a diferença entre uma almofada comum e uma almofada holandesa?
Mexeu no cabelo ignorando a pergunta como se não a tivesse ouvido e dirigiu-se até a porta. Ouvi o barulho da chave rodando na fechadura. Lá do corredor chegou até mim sua voz debilitada.
- Não esquece de pegar a sombrinha, vai chover.
Fui até a janela e ainda pude vê-la subindo a rua do outro lado da calçada.

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