domingo, 25 de maio de 2014

Vampiro

Então, diante de uma plateia pouco empolgada, recebi de minhas próprias mãos o Oscar de melhor ator coadjuvante. Em silêncio me perguntava se este outro eu que me sorria azedo, era o melhor protagonista ou se estávamos ambos destinados à figuração. Entretanto, na hora do discurso, improvisei:
Agora, a essa hora, copulam o céu e a terra, corpos dançam boleros do desamor, castos juram vinganças de sangue e cegos fazem promessas que jamais poderão cumprir. Pois essa é a natureza dos amantes.
Depois, Caetano Veloso cantou:
"Você é uma loucura em minha vida,
Você é uma navalha para os meus olhos,
Você é o estandarte da agonia que tem a lua e o sol do meio-dia."
Por isso, eu sou o vampiro.

sexta-feira, 23 de maio de 2014

sobre nós

Enfim, sós.
Pelo vidro iluminado a chuva escorre,
Debaixo do poste, cultivo ideias sobre nós.

Em margens opostas esperamos.
A roupa aperta, a palavra falta,

Não são apenas anos, é o tempo.
Quando esse futuro virar passado,
Não bastará.

Porque tua imagem - olhos que me sentem,
Terá se diluído em possibilidades,
Páginas em branco.

terça-feira, 13 de maio de 2014

A cidade também é feita de pegadas

Caminhando pela cidade, percebi, com certo alívio, que não somos este lugar que ocupamos, nem ele é o mesmo para aqueles que o compartilham conosco. Não somos, tampouco estamos juntos. Partilhamos o ínfimo dessa substância cujo nome convencionamos chamar realidade, talvez lhe caísse melhor concretude. Incapaz de compreender os outros, não compreendo a vida, pois um movimento implica no outro como se fossem pequenas caixas dentro de outras maiores, ou o cubo mágico e sua dinâmica integrada. Todavia, não sou pessimista, apenas desconfio que venho falhando por existir pouco. Igualmente não desejo ser leviano. Tomar café, ler livros e escrever frases não constituem em si prova de humanidade, ou prova de uma coisa qualquer, um sentido objetivo. A vida, ás vezes, pode ser apenas um suspiro preguiçoso ou uma tarde de sono despreocupada. Não suporto deixar-me caído no sofá, de boca entreaberta, sentindo o vagar incipiente das horas. Porém, de modo arbitrário, o tempo me ultrapassa. O sol sucumbe à noite e o cosmos segue impenetrável seu ritual de morte. Então, dou a mim esta tarefa de permanecer de olhos abertos entre a descrença e a fé, gestando uma espécie de renascimento. Atento ao movimento sutil das palavras.